quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Magia


Ontem li uma entrevista do artista Cristiano Lenhardt sobre seu trabalho Diamante...eu tinha pego seu catálogo numa tarde singela e cinza, de espera, sem expectativas... e o que, para mim, apareceu de dentro daquelas páginas foi muita magia. Magia, eis a palavra perfeita. E eis que é esta palavra que Cristiano usa para falar da inspiração de seus trabalhos. Teoria ou intuição? é interessante dizer que essas coisas não se excluem, mas é muito interessante também perceber o quanto a intuição tem sua forma de trabalhar. Perguntado sobre qual a sua escolha, Cristiano responde algo como: "Antes eu era muito mais preocupado com os conceitos, em definir os conceitos para meus trabalhos...hoje eu sinto uma imagem...e eu fico sentindo, entro em contato com ela, para sentir como ela quer ser feita, e só então eu começo a definir os meios para fazê-la". Eu achei lindo. Simples assim. A intuição, a magia ou seja lá que palavra expressar qualquer processo de percepção da vida que não passe primeiro pelo julgamento da razão, ela nos toma, nos fala, ela tece suas raízes em algum lugar de nós e dali vai nos passando seus ensinamentos, suas verdades mais íntimas, nossas verdades. E trabalhar assim, parece quase uma incorporação. E parece estranho, você sente o texto? você deixa as imagens falarem? você faz o que o poema te diz, o que ele pede?

Eu mais do que nunca estou certa que a intuição sabe trabalhar muito bem e ajuda a razão a organizar o caos de palavras, conceitos ou teorias que se perderiam dentro de nós se não fosse a magia da intuição. Acho que é ela que nos conduz. Mas enfim, a intuição também precisa de abertura, de leveza e acho que um pouco de fé, de crença. Não uma fé cega, um voto de confiança. Por que relutamos tanto em dar a ela espaço em nossas vidas, se quando ela vem é tão sutil, é tão inteira e é tão simples? Não sei, mas acho que é preciso sonhar e afirmar nossos sonhos...nossos gostos, desgostos, encantamentos, incoerências, desatinos...sem querer primeiro saber se posso ou não, se é coerente ou não, se alguém já legitimou ou não, em qual conceito, teoria, análise minhas palavras, sentimentos e pensamentos se encaixam...eu não quero condenar a razão, sem ela andaríamos vagando, sem delinear formas pra nós mesmos...mas se a vida é o império da razão, então ela não é vida vivida, é vida forçada, é vida sofrida....porque Ser passa a ser dor. Vida, intuição e razão, é espontânea, leve, natural, consciente, irracional e, enfim, mágica...

terça-feira, 5 de abril de 2011

A arte de ser outra



No último post, falei do espanto ao nos encontrarmos com nós mesmas. Pois então, realmente é uma surpresa descobrir tantas possibilidades e tantas outras dentro de nós. Pode parecer clichê ou texto de auto-ajuda, não importa, o que interessa é a potência que essas "outras" exercem em nossas vidas e o que pedem em troca, afim de dar mais brilho e colorido às experiências que achamos estar acostumadas, à rotina.
Pois então, quem nunca experimentou ser outra? não apenas superficialmente, mas de forma íntima e intensa, pelo menos em um momento específico, em uma determinada circunstância? falar coisas diferentes, pensar por outros caminhos, ter reações que geralmente não teria, ou pelo menos, se permitir ser, sentir e dizer coisas que o seu "eu" normal não comportaria. Escolher uma entre tantas diferentes possibilidades em nós e colocar em prática, dar vida, instituir no mundo uma outra de nós, com outro comportamento. O que para algumas pessoas pode ser uma angústia, em diferentes situações pode ser libertador. 
Bom, falo do "alto" dos meus 26 anos...é, cheguei neles com uma sensação de que estava passando para a segunda metade dos meus vinte e poucos anos e que, de certa forma, já tinha adquirido uma autonomia suficiente para experimentar me ver diferente. Meu encontro fatídico se deu, não é pra menos, na frente de um grande espelho...Entro numa grande loja de departamentos, com diferentes opções de roupas, para todos os estilos (não era a Renner) e escolho, "por acaso" uma roupa que eu jamais associaria ao MEU estilo, ao estilo Raquel, aquele que várias pessoas podem olhar e identificar...então escolho, pra ver como fica...e gosto! a sensação é estranha, pois aquele novo "disfarce" coube direitinho em mim, e não só coube como ressaltou muito mais de uma Raquel que até para mim estava um pouco escondida...
E realmente é libertador e animador dar vida ao "personagem", percebendo o quão variadas podemos ser...e, todos os possíveis clichês à parte, posso afirmar que é realmente excitante ver que posso mudar ou me mostrar de outra forma sem que com isso, meu "eu" se sinta ameaçado... por muito tempo criamos uma imagem de nós e passamos anos alimentando-a, achando que ela nos dá sentido...quando tudo pode ser o contrário...e vejo isso hoje desse "alto" dos meus 26 anos!  

sábado, 19 de fevereiro de 2011

O espelho e a sombra

Do encontro com nós mesmas...



hoje estava assistindo ao trailer de "Cisne Negro" e lendo algumas críticas a respeito do filme. O que me pareceu, a princípio um filme sobre o cotidiano de rígida disciplina exigida pela arte, se mostrou um mergulho muito mais profundo nos abismos da alma de uma mulher. Nina, a doce e delicada bailarina, protagonista que deseja nada menos do que ser perfeita, encontra nesse caminhos obstáculos que aos poucos vão se revelando ser fragmentos desconhecidos dela mesma. Sua antagonista, Lily, é a mulher sensual e desinibida que amedronta e fascina Nina, que serve para ela como um espelho, e a faz, com muita dor e sofrimento, buscar romper o casulo de sua doçura e ingenuidade quase infantis que a aprisionam, machucam e a impedem de se realizar. Lily está fora do padrão de Nina e ameaça sua personalidade rigidamente constituída.

Esse antagonismo das duas me fez pensar em algumas questões que marcam profundamente as relações femininas. A descoberta do corpo, do prazer e da própria sexualidade, dos desejos inconscientes, da rivalidade, inveja e competição, da angustia permanente entre realizar-se e tornar-se uma mulher completa e corresponder às expectativas de outros. Expectativas que, no caso de Nina, viram uma tortura permanente.
Acredito que os conflitos de Nina não são um caso especial. Podem ser até muito comuns. Acredito que para todas as mulheres, a descoberta de uma infinidade de nuances e possibilidades dentro de nós pode ser assustadora, pois significa a descoberta de uma outra, ou várias outras dentro de cada uma. Então...que mulher não foi educada para ser doce, meiga, dócil...uma boneca? que mulher nunca aprendeu que sentir ou expressar a raiva é condenável, é desagradável? acredito que muitas podem ter ouvido, assim como Nina "eu sabia que você não conseguiria" ou "desse jeito ninguém vai gostar de você". Enfim... que mulher, hoje, não se tortura pela necessidade de ser perfeita, linda, inteligente e bem sucedida? sem contradições, sem incoerências e o que é melhor (ou pior) sem frustrações, raiva, medo, inveja, ciúmes ou insegurança?... pois nada disso condiz com as boas maneiras esperadas de boas meninas.

O que quero dizer é que muitas de nós fomos e continuamos a ser criadas desconhecendo uma boa parte de nós mesmas...parte essa que nos permitiria grandes saltos, ou voos livres. Muitas de nós cresceram engessadas, ensinadas a ser frias como bonecas de porcelana. Até que um dia...o espelho quebra, e o que parecia uma imagem, se tornam muitas, cacos, fragmentos, que podem nos surpreender.
Essa é a descoberta de Nina, essa pode ser minha descoberta, ou de muitas outras...a descoberta de muitas em nós.

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

sobre a insustentável leveza do ser...



Ando pensando no que realmente caracterizaria nossas vidas, minha vida? os personagens de A Insustentável Leveza do Ser, de Milan Kundera, nascem e morrem sob o signo ou da leveza ou do peso e buscam constantemente a razão para suas existências num desses dois pólos da experiência, humana, buscam realizar-se através dessas duas formas de expressão de suas almas. Tereza ou Sabina? Franz ou Tomas? gostaria de saber realmente o que me motiva...o sabor efêmero de cada experiência passageira, a delícia secreta de cada traição (traição à origem, à casa, ao que se espera de nós, ao Kitsch...), enfim, a leveza de não pertencer a lugar nenhum e querer estar em todos ao mesmo tempo, ou a força das raízes, o peso do que é duradouro...a permanência? onde me realizo, na Grande Marcha da humanidade, ou na singularidade?

lendo este belo livro de Kundera, acredito que a grande arte da vida seja justamente acharmos o ponto de equilíbrio entre a leveza e o peso, entre o efêmero e o permanente, em unir tudo aquilo que ,querendo ou não, possuímos e carregamos, com o que faz e se desfaz em nossas vidas, ao sabor de um vento indefinido, do destino quem sabe? então, como tranformar o peso em leveza, e como dar consistência aos sentimentos passageiros se muitas vezes o melhor de cada experiência está em ela ser densa ou sutil...leve?. Eu ainda não sei...

confesso que prefiro a leveza...me parece mais bela e sutil...e me encanta a forma passageira das coisas. O desapego, o desnecessário.Tudo o que é duradouro me assusta, tudo o que é permamente me comprime, me esmaga como o peso de um piano. Mas com o tempo percebi que querer esquecer o peso das coisas é muitas vezes torná-las ainda mais insuportáveis, como toneladas em nossas costas...querer viver apenas da leveza tem suas desgraças, redemoinhos, vendavais e retornos ao que parece sólido e estabelecido...porém, viver apenas do peso produz angústia e falta de ar...a sensação de obrigação e dever, faz da vida um cativeiro...

Enfim, como a personagem Sabina, prefiro minha imagem refletida no espelho e o sabor de pátrias traídas...